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Qual será o “Justo” Valor da Renda?

 

João Anastácio

13-Set-2012

 

 

 

Surgem constantemente declarações exigindo que o arrendamento de imóveis seja feito na base de um valor de renda “justo”, afirmação com que naturalmente todos estamos de acordo; resta apenas definir qual é esse valor…

 

A resposta simples é que tal valor deve ser determinado pelo mercado, mas a verdade é que os montantes assim encontrados são sempre considerados exagerados pelos inquilinos e insuficientes pelos senhorios…; por outro lado, o mercado, no caso do arrendamento urbano, embora possa dar uma orientação, não pode ser preciso, pois só em casos muito especiais podem existir duas habitações iguais. Todas são diferentes em função, não só da área, mas da sua localização geográfica, orientação solar, nível do andar em relação ao solo, panorama de que disfruta, tipo de acabamentos, estado de conservação, facilidade de estacionamento e de muitos outros fatores que tornam impossível ser o mercado a definir um valor indicativo válido para a tal "renda justa". Por este caminho não a conseguiremos encontrar... Procuremos outro.

 

O arrendamento pode descrever-se, genericamente, como um serviço prestado por um investidor que disponibiliza a terceiros o uso temporário de uma área habitacional ou comercial, de que é proprietário, mediante uma retribuição.

 

A Lei define o prazo mínimo e máximo desse Contrato, também para o distinguir do Contrato de simples alojamento, conferindo ao primeiro, entre outras coisas, características de maior estabilidade.

 

Este serviço é prestado a todos os que necessitam de uma habitação (ou de desenvolver uma atividade comercial) e que, pelos mais variados motivos, não podem ou não querem adquirir a área de que carecem.

 

Nesta base e pretendendo-se que o mercado do arrendamento exista e floresça, porque tal é do indiscutível interesse da comunidade, é necessário que quem nele investe tenha a perspetiva de poder vir a auferir uma normal remuneração ao capital aplicado, independentemente dos riscos inerentes á atividade. Esta remuneração concretiza-se hoje apenas na renda, uma vez que a valorização dos imóveis no tempo, para alem da inflação, pertence ao passado, assistindo-se até, neste momento, a uma queda significativa do seu valor no mercado.

 

Façamos então as contas, tentando determinar qual o montante - alvo de uma renda para que o investimento em prédios de rendimento se torne aliciante e, dessa forma, se chegue ao conceito de "renda justa" ou seja aquela que permite uma rentabilidade normal ao capital empatado no imóvel.

 

O preço de mercado para aquisição de imóveis deveria ser fácil de determinar, pois é basicamente função do custo do terreno e do da construção. Mesmo assim ainda subsistem muitas variáveis, pelo que achamos que a determinação da tal "renda justa" terá de ser feita caso a caso, dentro de um esquema de raciocínio que iremos esquematizar. 

 

A Lei determina, para cálculo do Valor Patrimonial Tributário, a quantia base de € 603 por m2, ponderada, principalmente, pela localização do fogo e sua antiguidade, atingindo um valor que, por definição, deverá ser inferior ao valor de mercado, mas que rondará os € 700/900 por m2.

 

Após termos feito uma pequena análise aos preços dos apartamentos em venda na cidade de Lisboa, concluímos que para um T2, o preço de aquisição se situa entre os 1.000 e os 2.000 euros por m2., ou seja, aproximadamente, o dobro do V.P.T. para esse fogo.

 

Consideremos assim, para efeito desta análise, o preço base de € 1.500/m2, ou seja, a aquisição, por hipótese, de um apartamento de 70 m2, implicaria um investimento de cerca de €100.000.

 

Se o investidor pretender obter uma remuneração líquida anual do capital aplicado de 4% terá, naturalmente, de calcular um valor para a renda anual que, deduzido dos encargos inerentes ao andar arrendado, atinja o montante anual de renda de € 4.000.

 

Vejamos então que encargos serão esses:

 

 

1.

Imposto Municipal Imóveis  0,5 % x €800 x 70m2

€ 280

2.

Taxa de esgotos 0,125 %

€ 70

3.

Seguro de incêndio 0,1 %  

 € 100

4.

Conservação e Manutenção        a)                 

€ 800

5.

Diversos. Certificado energético, selo de contrato, administração (emissão e cobrança de recibos, cartas registadas obrigatórias etc.)         b)                  

€ 40

6.

Imposto sobre o rendimento 25 %

€ 1000

 

TOTAL

€ 2290

 

Observações. a) e b) são valores calculados na base de, respetivamente, 20% e 1% sobre o valor anual da renda base. Na determinação do valor do I.M.I. e da Taxa de Esgotos, considerámos o V.P.T. médio (€800 m2). Para as restantes verbas tomámos como base o valor da renda sem encargos.

 

Sendo a taxa de IRS influenciada, hoje, não só pelos rendimentos prediais mas também por todos os restantes, optámos pela taxa de 25% por ser a que incide atualmente sobre os rendimentos do capital e, diz-se, passará a incidir no futuro também sobre os rendimentos prediais, como taxa liberatória. Ignora-se como será calculada a base de incidência desta taxa, se sim ou não com dedução de I.M.I. e despesas de conservação e manutenção ou, simplesmente, sobre o rendimento bruto. Para efeito desta análise e sua simplificação, adotámos esta ultima hipótese.

 

Tudo considerado, o valor da tal "renda justa" seria, no enquadramento exposto, de cerca de € 525 mensais (renda base anual acrescida das despesas indicadas, o total repartido por doze mensalidades) sendo certo que o valor de mercado, com toda a imprecisão inerente, pelas razões atrás expostas, rondaria os € 700 (taxa de rentabilidade de 6%).

 

Será que a taxa de rentabilidade líquida de 4% para a aplicação de capitais em imóveis, nas atuais circunstâncias de mercado, é suficientemente interessante para atrair investidores que, dedicando-se a esta atividade, provocassem, pela concorrência que surgiria, a aproximação da renda de mercado ao da "renda justa"? Ou será que a atual renda de mercado já é a tal "renda justa", definindo-se esta como a mínima que permite a chamada de investidores para o arrendamento, aquilo que na síntese da língua inglesa, corresponde ao "buy to let"?

 

Não sei responder com convicção, mas suponho que, conhecendo pessoalmente as agruras e dificuldades da gestão de prédios de rendimento, a taxa de remuneração de 4% ao capital empatado, não é suficientemente aliciante para trazer investidores para esta atividade económica. Muitas outras existem que dão menos problemas e riscos de gestão e remuneram melhor. 

 

FIM

 

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