Reabilitação na Cidade do Porto
Carlos Teixeira[i]
13-Jun-2013
Falar de reabilitação no Porto numa altura em que um
relatório do ICOMOS - Portugal (Comissão Nacional Portuguesa do Conselho Internacional dos Monumentos e dos Sítios) que foi enviado
para a UNESCO entidade que classificou o centro histórico do Porto como Património da Humanidade, relatório este que faz duras críticas
à Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) Porto Vivo pela sua intervenção nas Cardosas, no centro histórico do Porto; criticas como"incumpridora da lei portuguesa do património", "atentatória dos bens declarados e inscritos na lista do Património Mundial" e "totalmente contrária
a todas as recomendações internacionais", posto isto, é realmente pertinente falar de reabilitação não só do centro histórico do Porto
mas também da cidade e de todo o Pais.
Estas polémicas são fruto de uma falta de conhecimento e inexperiência dos intervenientes
nos processos de reabilitação e regeneração do património, prática esta pouco comum no nosso Pais, provocando deste modo este tipo
de resultados, pois só na última década se deu importância a programas abrangentes de reabilitação urbana.
Uns bem sucedidos
outros nem por isso.
Fruto de uma cultura e de uma economia da construção, alicerçada na construção nova que nas décadas de 90
e 2000 foi excessiva em Portugal, aliada ao facto de a concentração urbana se ter feito num quadro de expansão dos subúrbios e desordenamento
territorial, abandonando deste modo os centros históricos e a sua reabilitação para investir na periferia, com a construção de novas
habitações, vindo a resultar no seguinte facto: o peso da reabilitação em Portugal é apenas de 6,5 % ao contrário da média europeia,
que se situa nos 36,8 % e onde a predominância da Reabilitação/Regeneração e manutenção é evidente.
Existe atualmente um consenso
alargado para a conservação e a reabilitação urbana. Estes constituem sectores estratégicos para a Europa que se preocupa com a Regeneração
e sustentabilidade das cidades e do seu património. Deste modo, é manifesto que a tendência para a conservação do património e a reabilitação
e regeneração urbana são sectores fundamentais para a revitalização económica das nossas cidades e onde, evidentemente, o Porto, pelo
seu legado e património, tem um papel preponderante para o Pais e sobretudo para todo o Norte.
Investimento em Reabilitação
É
de conhecimento generalizado que os indicadores de confiança e de clima económico têm vindo a degradar-se no Pais. As autarquias e
a administração central não possuem recursos financeiros para avançar com grandes programas de reabilitação urbana, mas, em contra
ciclo este papel está a ser levado a cabo pelo investimento privado, que tem vindo a aperceber-se de todo o potencial da reabilitação.
Investimento
privado com inúmeros exemplos de regeneração/reutilização, desde simples edifícios a palacetes ou mesmo conventos que estavam votados
ao abandono e que hoje são residência de estudantes Erasmus, residências temporárias de tipologias T0 e T1, assim como pequenas unidades
de alojamento local (designados por hostel). São exemplo também, as antigas fábricas que sofreram processos de regeneração/reutilização
reconvertendo-se em espaços para pequenas empresas, lojas, restaurantes e livrarias destinadas a novos públicos, mais cosmopolitas.
Este tipo de investimento privado passa por aproveitar ao máximo o que já existe dos edifícios e com um investimento mais contido
procurar arrendar quartos, casas ou espaços comerciais e/ou serviços numa primeira fase, e com opção de compra numa segunda fase com
uma meta a médio/longo prazo, gerando deste modo o retorno do investimento.
Incentivos à reabilitação
A decisão para a reabilitação,
do ponto de vista da sua viabilidade económica é cada vez mais condicionada pelas baixas perspetivas de vendas, pela taxa de juro
crescente e pela dificuldade na obtenção de financiamento bancário. Contudo, a tendência do crédito concedido à construção, destina-se
cada vez mais à reabilitação urbana, para projetos de prédios de rendimento ou equipamentos hoteleiros e/ou turísticos, todos eles
bem projetados e bem desenvolvidos e onde a rentabilidade económica dos investimentos é um dos principais critérios para a atribuição
de incentivos ou de acesso ao crédito.
Atualmente existem alguns instrumentos de incentivos que vão desde os instrumentos fiscais a instrumentos financeiros como por exemplo o fundo JESSICA Portugal, do Banco Europeu de Investimento que pode ser utilizado em conjunto com outros apoios.
Este fundo apoia a reabilitação do património, desde a sua conservação à melhoria do património histórico/cultural,
projetos destinados a fins turísticos ou de serviços, como residências destinadas ao aluguer temporário.
O fundo JESSICA Portugal
apoia também a reconversão de áreas industriais abandonadas, desde a sua demolição e descontaminação, mas principalmente a sua reconversão
em espaços para PME’s como instalações e escritórios para investigação e desenvolvimento, cujas atividades se desenvolvam em sectores
inovadores. Apoiando também a reabilitação ou melhoria de infraestruturas urbanas existentes desde o espaço público como ruas, praças,
assim como estações de transportes públicos ou parques de estacionamento.
O papel dos Arquitetos
O papel dos arquitetos e dos
seus gabinetes que intervenham em Reabilitação, numa primeira instância terão que fazer um trabalho de diagnóstico exaustivo do estado
do imóvel, para que sustente a intervenção e seja possível adequá-la ao programa definido, evitando deste modo um erro recorrente
nos processos de reabilitação que é a desadequação dos projetos de arquitetura e de engenharia às características intrínsecas dos
imóveis e que resultam em intervenções demasiado intrusivas.
Este processo de reabilitação deve ser o mais participativo possível,
estando ao serviço de todos os intervenientes, pensando o património e a cidade como um bem de todos e deve pressupor uma intervenção
criteriosa, criando valor ao Património, portanto não lesivo do mesmo, como é o caso da demolição indiscriminada de todo o interior
do edifício e onde apenas se preservam as suas fachadas.
O papel dos gabinetes de arquitetura na reabilitação, apoiados pelas
suas equipas pluridisciplinares, passará principalmente por conhecer bem o mercado e as suas tendências e ter a criatividade necessária
para intervir no património, assim como nos centros históricos, centrando-se na criação de dinâmicas de atratividade, valorizando
o tecido urbano para atrair de novo a população a estes locais.
Mas, para além dos tecidos urbanos das cidades, devem igualmente
encarar a reabilitação das aldeias históricas e o seu património cultural e agrícola, colocando ao serviço do desenvolvimento económico
e social das populações, como por exemplo a introdução de equipamentos hoteleiros vocacionados para o turismo rural, cultural ou ecoturismo
ligados à valorização da paisagem e dos centros históricos, assim como das explorações agrícolas, nomeadamente vinícolas.
Reabilitação,
arrendamento e seus custos
Fruto de vários constrangimentos, já sobejamente conhecidos, como o regime de arrendamento urbano, as rendas congeladas e desajustadas face aos valores anuais da inflação, refletiram-se no empobrecimento dos senhorios e na delapidação patrimonial, resultando na inexistência de um verdadeiro mercado de arrendamento em Portugal, afastando grandes e pequenos investidores, tendo sido um entrave à reabilitação; no fundo, uma falta de confiança no mercado de arrendamento, que agora começa a dar os primeiros passos, originando neste momento uma janela de oportunidades.
A matéria-prima existe; inúmeros imóveis, completamente devolutos
e degradados aguardam por uma intervenção, resultando na retoma económica expectada.
Este surgimento do mercado do arrendamento,
fruto do atual constrangimento do crédito imobiliário destinado à compra habitacional, aliado à nova lei do arrendamento, reúne as
condições necessárias para garantir rentabilidade e confiança para este tipo de investimento.
Devemos contudo encarar a reabilitação
destinada ao mercado do arrendamento como um investimento de médio/longo prazo, que face a outras aplicações, prova que o património
é uma excelente solução financeira, protegida do “confisco” a que assistimos atualmente, como por exemplo, o caso dos bancos cipriotas.
Os
custos da reabilitação, ao contrário do que se julga, nem sempre saem mais onerosos, face à construção nova (de raiz). Tudo depende
do conhecimento e experiencia dos intervenientes, assim como do grau de intervenção que se pretende. A melhor reutilização possível
dos edifícios, regenerando apenas as suas funções, poderá sair bem mais barato, pois reabilitar é também reutilizar, fazer muito,
com pouco.
Numa conjuntura de escassez de meios financeiros, a reutilização de um imóvel, pode ser a melhor opção.